Modelo de Gestão Rodo-Ferroviário - Fusão das Empresas REFER, EPE e EP
A ADFERSIT realizou no dia 03 de novembro de 2014 a sessão intitulada “Modelo de gestão rodo ferroviária – fusão das empresas REFER, EPE e EP-Estradas de Portugal, SA”. Foram oradores o Sr. Dr. António Ramalho, presidente da EP e coordenador da Comissão de Acompanhamento para o processo de fusão entre as 2 empresas, e o Sr. Dr. Joaquim Polido, membro da Direção da ADES-Associação em Defesa do Estado Social. A Sr.ª Prof.ª Rosário Macário, professora universitária do Instituto Superior Técnico e consultora na área dos transportes, moderou a sessão.
O Dr. António Ramalho expôs o objetivo de uma gestão integrada entre rodovia e ferrovia. Nos últimos 10 anos o Estado investiu 1/3 em ferrovia e 2/3 em rodovia, tendo-se aprofundado nos últimos 5 anos para ¼ para a ferrovia e ¾ para a rodovia. Este volume de investimento melhorou significativamente a nossa posição competitiva internacional, conforme é relatado pelo World Economic Forum: a ferrovia passou de 25.º para 23.º e a rodovia de 14.ª para 2.º. O investimento efetuado não impediu contudo uma contínua redução de tráfego. Conclui-se assim que o modelo atual de financiamento das infraestruturas não é sustentável, possui um fraco planeamento integrado e apresenta fracos resultados económicos. A continuação deste modelo implicaria um deficit anual de 1,2 mil milhões de euros, ou um dividendo negativo para a rodovia de 53% e para a ferrovia de 62%. Atualmente existe ainda alguma capacidade de investimento, através dos fundos comunitários, mas que implicará a existência de alguns pressupostos:
- A prévia sustentabilidade será fundamental para o desenvolvimento do sector.
- A coordenação intermodal deve presidir à decisão de investimento e não apenas à gestão operacional.
- A análise custo/benefício deve enquadrar soluções de coopetição modal e não de concorrência entre modos.
- A decisão de investimento é determinada pela democracia da procura e não pela “teocracia” da oferta.
É necessário por isso operar uma revolução intermodal, nos seguintes aspetos:
- Na organização do sistema, através de - planeamento estratégico, fusão das representações, regulação integrada, contratualização comum.
- No funcionamento do sistema, através de - planeamento operacional, gestão corporativa conjunta. - Gestão Integrada da Oferta, através de - terminais rodoferroviários, Park & Ride,extensão interland portuário (co-mobilidade).
- No financiamento do sistema, através de - transferência de fundos Dark-Green, integração dos acessos e captura de valor, otimização dos ativos.
- Na valorização das competências, através de - criação de centros de competência intermodal, internacionalização integrada, refundação da engenharia de conservação.
O Dr. Joaquim Polido iniciou a sua intervenção chamando a atenção para o facto de que no chamado “mundo ocidental”, onde Portugal se inclui, a governação tem sido feita no pressuposto de que toda a economia se ajusta em função do mercado, criando assim, e automaticamente, bem-estar para os Estados. Para além disso criou-se uma corrente de pensamento em que o objetivo da gestão é o da criação de valor, passando-se rapidamente, para a criação de valor para o acionista, como foco principal, se não único da gestão.
Abordou de seguida as razões pelas quais considera ser esta fusão inadequada: a nível institucional não é credível porque junta coisas diferentes, perdendo-se assim a capacidade de intervenção através destas instituições; ao nível técnico-operacional, as competências hard e soft exigidas são tão específicas, em cada uma das áreas, que dificilmente podem ter algum aproveitamento na outra área, para além de haver o risco da perda de conhecimento distintivo por desfocagem do objeto; ao nível do conhecimento, é o saber e o saber-fazer detido pelas pessoas que, em cada momento, estão nessas organizações, sendo a exploração ferroviária otimizada, quando a relação “roda-carril” é vista em conjunto e não cada uma por si; ao nível da empregabilidade, o Estado deve criar condições, para que a economia crie empregos estáveis e adequadamente remunerados, sendo que o setor ferroviário, no seu conjunto, tem um potencial enorme para criar empregos qualificados e altamente qualificados.
Em conclusão referiu que a gestão ferroviária tem de voltar a ser global e manter-se autónoma, devendo o Estado assumir, em definitivo, a dívida histórica, das empresas ferroviárias. A questão da bitola europeia é fundamental para o futuro de Portugal, como membro de pleno direito da União Europeia.
Quanto aos gestores cumpre dizer que muitos assumem responsabilidades em empresas públicas, embora não tenham qualquer visão sobre a coisa pública. Finalmente há que registar que em Portugal não existem reguladores competentes.
No final destas exposições a Prof.ª Rosário Macário referiu um problema recorrente na nossa sociedade: a dificuldade em clarificar as funções de cada entidade. A REFER e a EP são empresas e não se devem assumir como instituições. Mencionou também que o planeamento estratégico é fundamental, mas isso não depende da fusão das empresas. O planeamento estratégico é um problema político que está a ser resolvido erradamente ao nível empresarial. Outra questão fundamental é a falta de bases confiáveis, a partir das quais se fazem estudos e se tomam as decisões.
No período reservado à participação da audiência, as principais questões colocadas foram:
- É imperioso que Portugal apresente até fevereiro de 2015 projetos credíveis junto da União Europeia, para poder usufruir dos financiamentos disponíveis. Apenas o projeto do consórcio ELOS estará em condições para ser apresentado. O Dr. António Ramalho referiu que existem vários projetos que irão ser apresentados.
- Dizendo-se que a fusão vai propiciar formas eficazes de cooperação, implica admitir a atual fraca intervenção da Secretária de Estado dos Transportes.
- Admitindo-se que estas 2 empresas têm espaços em excesso estamos a colocar em causa a atuação das suas atuais e anteriores administrações.
- O sistema ferroviário europeu tem funcionado com muitos constrangimentos nacionais; a operação ferroviária tem sido caraterizada por empresas monopolistas que impedem a livre entrada de outros operadores.
- A não existência de qualquer fusão não é impeditivo de haver coordenação.
- 80% das nossas trocas com a União Europeia fazem-se por rodovia. Isto só se resolve com a bitola europeia. A fusão não tem em conta a necessidade de se garantirem os necessários financiamentos.
- Como é que os privados podem participar neste modelo de gestão rodo ferroviário? O Dr. António Ramalho referiu ser esta uma questão que se irá colocar numa fase posterior. - A mobilidade tem de ser feita com o mais baixo custo possível e a maior comodidade possível.
- Em Portugal só construindo uma infraestrutura de transportes e logística devidamente coordenada se pode garantir que tudo esteja ligado com tudo.
Para finalizar foram deixadas pelo Dr. António Ramalho as seguintes ideias:
- A fusão é apenas uma solução. No entanto, em sua opinião, é uma solução com vantagens que sistematizou:
Vantagens ao nível dos custos
- Redução de custos de procurement
- Redução de custos nos serviços partilhados e na área corporativa
- Redução nos custos operacionais por aplicação das “boas práticas”
- Redução dos custos em instalações e outras “facilities cost”
- Possibilidade de criar receitas dark-green contratualizadas
Vantagens ao nível da receita
- Alargar a base de utilização da infraestrutura por operadores de comunicações
- Garantir remunerações adicionais nas estruturas co-modais
- Alienação ou concessão de “facilities” excedentárias
Vantagens ao nível da valorização patrimonial
- Alargamento do modelo de concessão geral da Rodovia à Ferrovia
- Garantir um modelo cooperativo na gestão de ativos concessionáveis
- Caracterizar como intermodais certos ativos de empresa
- Criar espaços integrados de rebatimento modal (passageiros) ou de logística intermodal (mercadorias)
A REFER e a EP não têm como função colocar carril ou construir asfalto, tem como função a mobilidade. E nesse sentido prosseguem o mesmo objetivo
- Os nórdicos optaram por dar dimensão às suas empresas, ganhando com isso um maior poder de intervenção para atingirem os objetivos.
- Com esta fusão vamos apostar num planeamento operacional alinhado com o planeamento estratégico.
- REFER e EP sozinhas não são sustentáveis. Vamos fazer o possível para que juntam o sejam.
-Nas atividades corporativas que podem ser conjugadas entre as 2 empresas estão 25% das pessoas.
Em relação à nota de que todos os benefícios da gestão intermodal, não devia depender de uma fusão de duas empresas, mas de um Planeamento Estratégico, o Dr. António Ramalho sublinhou que a decisão de fusão era claramente estratégica e tinha sido tomada por quem tem essa função que é o Governo. às empresas, REFER e EP caberá apenas executar essa fusão já decidida e fazê-lo bem e convictamente.
Videos da Sessão:
António Vila Verde Ribeiro - link
Prof.ª Rosário Macário - link
Dr. António Ramalho - link
Dr. Joaquim Polido - link
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