UMA AVALIAÇÃO DOS INVESTIMENTOS DO PNI 2030 – FERROVIA

UMA AVALIAÇÃO DOS INVESTIMENTOS DO PNI 2030 – FERROVIA

A análise e avaliação dos programas dos investimentos ferroviários propostos no PNI 2030 foi realizada no âmbito do apoio de consultoria prestado ao Conselho Superior de Obras publicas (CSOP) e teve como principal objectivo clarificar e densificar a identificação e caracterização dos investimentos a realizar na rede ferroviária nacional (RFN) e aferir da sua consistência, robustez e impacto na economia, na mobilidade, no ambiente e na coesão territorial.

 É reconhecido que num sistema de rede de prestação de serviços como é o caso da RFN o seu valor é, no essencial, determinado pela capacidade utilizável e pela sua conectividade e assim foi dada particular relevância aos efeitos dos investimentos propostos nestes dois atributos, uma vez que 60% da rede já apresenta uma capacidade utilizada acima de 80% (com 80% na rede estruturante).

 Esta circunstância sugere já fragilidades no desempenho que comprometem a qualidade dos serviços oferecidos e não conferem atractividade a este modo de transporte dificultando os objectivos comunitários de reequilíbrio das quotas nos segmentos rodo e ferro até 2030.

Neste contexto procurou-se aferir sobre os ganhos de capacidade de longo prazo alcançáveis com as soluções propostas em comparação com os tráfegos futuros; não havendo modelos estruturados de previsão da procura recorreu-se à correlação da economia clássica entre a evolução do PIB nacional e os volumes de transporte, utilizando os cenários socio-económicos construídos no âmbito do RNC 2050.

Procurou-se assim, nas avaliações feitas, tomar em atenção as soluções de investimento que, no longo prazo, possam conduzir a excessos de capacidade nas infraestruturas ou a desadequação com as expectativas do mercado, o que conduzirá à sua ineficiência e aos desvios dos recursos de investimentos mais produtivos, seguindo-se as recomendações da UE (Infraestrutures in the EU: Developments and Impact on Growth -2014).

Da metodologia de análise e de avaliação adoptada e centrada numa versão simplificada da AMC, possível pelas circunstâncias, construiu-se um ranking dos projectos que procura evidenciar a sua aptidão para responder aos requisitos e expectativas de políticas, económicas e dos mercados, nas suas dimensões de curto prazo e de longo prazo e também atender à sua maturidade.

Dado o seu especial impacto socio-económico fazemos particular menção aos seguintes programas:

  • Programa de Reforço de Capacidade e Aumento de Velocidade no eixo Lisboa-Porto: pretende separar os tráfegos de altas prestações dos mais lentos, condição essencial para o mercado responder em conformidade e de forma eficaz à emergência climática e reduções de CO2 neste corredor de elevada densidade populacional; a geografia de construção das novas linhas corresponde às secções da actual Linha do Norte mais congestionadas e saturadas e em risco de disrupção, a requerer intervenção imediata.
    Presume-se que os parâmetros de projecto destas novas linhas venham a permitir no futuro patamares de velocidade superiores, numa visão de uma nova infraestrutura nesta ligação num corredor geográfico onde as variáveis económicas e de mobilidade já sugerem intensidade de tráfegos plenamente justificativos deste objectivo.
  • Corredor Internacional Sul: Nova Ligação Sines – Grândola: Toma a sua posição no ranking pelo seu grande efeito na eficiência no segmento mercadorias em dois corredores de primeira importância da rede estruturante: no corredor internacional sul e no eixo Norte-Sul. 
    Razões de natureza financeira (custos comparados com investimento alternativo), económica (cargas/potencia de tracção) e de risco estratégico (aceleração dos investimentos na linha da Estremadura e na conexão Badajoz- Puertollano) justificam a pertinência deste investimento a concluir até 2025.
  • Ligação da Linha de Cascais à Linha de Cintura: Impõe-se uma reapreciação deste projecto uma vez que os seus pressupostos na óptica dos transportes, originários do princípio do século, estão completamente ultrapassados. 
    É um investimento que terá impacto insignificante na procura desta linha por não suscitar ganhos de mobilidade nem nos custos generalizados das deslocações daquele corredor.
    Esta ligação que serve uma procura essencialmente periurbana deverá ser abordada num contexto de territorialidade metropolitana e não nacional pelo que as soluções de investimento devem ser procuradas num quadro do sistema de mobilidade regional e em articulação com outros sistemas em sítio próprio existentes e futuros, numa óptica de maximização da conectividade de rede.
  • Corredor Internacional Norte: Linha da Beira Alta: é um eixo essencial do Corredor Atlântico e determinante para a competitividade das nossas exportações no âmbito do espaço ferroviário único europeu.

As tendências no tráfego internacional de mercadorias já visíveis e a firme intenção da CE em acelerar a concretização plena das RTE-T ( rede core) até 2030 justifica plenamente um reforço em soluções de investimento nesta linha e nesta década com o propósito de alcançar aumentos de capacidade utilizável assegurando maior fluidez e qualidade do serviço e, ao mesmo tempo, preparando os alicerces da introdução da bitola standard na rede estruturante na condição da plena interoperabilidade europeia.

O processo de recomendações do CSOP sobre o PNI 2030 - Ferrovia que se seguirá e as consequentes decisões politicas deveriam na nossa opinião promover a definição dos indispensáveis faseamentos e calendários de execução, omissos no Programa, atendendo e conciliando as necessidades e expectativas dos stakeholders no curto e no longo prazo, numa óptica de escalabilidade, de modo a que os investimentos não venham a ser reconhecidos no futuro como recursos aplicados no local errado, no tempo errado e para os mercados que já não existem, com todos os custos de oportunidade daí resultantes para a sociedade.

13 de Janeiro de 2020

Ernesto Martins de Brito
Presidente do Conselho Fiscal da ADFERSIT 
Ex Administrador e Presidente do Conselho de Administração da CP 

Leia aqui:
“Relatório Técnico de Avaliação do Programa de Investimentos PNI 2030 - Ferrovia – Sumário Executivo”  - link


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